Após acompanhar 20 crianças de duas escolas da rede pública do Recife (PE) ao longo do primeiro ano do Ensino Fundamental, pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) observaram que 70% delas ainda não eram capazes de ler e escrever palavras de forma espontânea ao final das aulas. Os resultados do estudo foram publicados em janeiro, na publicação científica “Educação em Revista”.
Para os pesquisadores, isso se deve à inadequação do método fônico imposto pela rede de ensino, que prioriza o treino isolado da pronúncia de fonemas para a aprendizagem da leitura e escrita em português – o famoso “beabá”. “Nossas análises atestaram que as crianças tiveram dificuldade em responder diversas tarefas de consciência fonêmica que psicólogos e autores de livros didáticos vêm tratando como requisitos para a apropriação do sistema de escrita alfabética”, conta Silvia de Sousa Azevedo Aragão, doutoranda do Centro de Educação da UFPE.
Busca por métodos alternativos é necessária
As 20 crianças foram submetidas a nove tarefas de consciência fonêmica, que testam a capacidade de dividir e reorganizar sons individuais dentro de palavras, e três de leitura de palavras, frases e textos. Na maior parte das atividades fonêmicas, o desempenho médio foi inferior ou igual a 60%. Ao lerem, apresentaram bom desempenho apenas na leitura de palavras, correlacionada a poucas habilidades de consciência fonêmica.
Ao final do primeiro ano, já escrevendo e lendo palavras em função de terem dominado várias letras, elas continuavam com um rendimento médio inferior a 50% em quatro das nove tarefas de consciência fonêmica: sintetizar fonemas para formar palavras (48,75% de acertos); produzir palavras com o mesmo fonema inicial (47,5% de acertos); subtrair fonemas em início de palavras (também 47.5% de acertos); e segmentar palavras em fonemas (apenas 17,5% de acertos). Para todos, apenas uma tarefa foi “muito fácil”: a identificação de palavras com o mesmo fonema inicial, na qual apresentaram rendimento médio um pouco superior a 80% de acertos.
Para Aragão, os achados podem contribuir para reflexões sobre novas alternativas pedagógicas. “É urgente um debate a respeito de quais habilidades fazem sentido ser promovidas na escola, desde a educação infantil, para ajudarmos todas as crianças, independentemente de sua origem sociocultural, a compreender o princípio alfabético e a se apropriar da língua portuguesa. Não é razoável ‘torturar’ crianças fazendo com que elas pronunciem à exaustão os fonemas isolados de cada palavra, adicionando ou subtraindo fonemas, por exemplo.” Como alternativa, a pesquisadora sugere atividades lúdicas, envolvendo jogos ou cantigas, e outros textos poéticos da tradição oral.