12 de outubro de 2023 Foto: Prefeitura de Manaus
Seca em outubro de 2023 no Rio Negro, no Amazonas

Por Gabriel Costa Borba

Na Amazônia estima-se que a pesca produza em média 173 mil toneladas de peixe por ano, gerando cerca de 389 milhões de reais. A região é considerada uma das maiores do mundo em consumo de peixe que varia de 135 a 292 kg per capita ao ano, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Esse contexto de pesca abundante está em risco por causa da seca dos rios da região.

A captura de peixe é fortemente dependente das flutuações no nível de água com períodos de águas baixas e altas, que regulam a disponibilidade de alimento e abrigo para os peixes nos rios amazônicos. Esses rios estão em risco devido ao impacto de atividades humanas. Ao alterar as flutuações no nível de água e o padrão de chuvas, os eventos climáticos extremos geram drásticas consequências para a pesca.

Além de rios com menos água, temos, no atual contexto, péssimas condições hídricas, como temperatura elevada e falta de oxigênio — o que resulta em uma maior mortalidade natural de peixes. Com menos peixes disponíveis, a própria segurança alimentar de populações locais se vê ameaçada.

O interessante de se observar é que ainda não temos total conhecimento sobre os prejuízos gerados pelos cenários de seca deste mês na pesca da região. A resposta das populações de peixe sob efeito de flutuações no nível de água leva um tempo, ou seja, os impactos da frequência e intensidade de eventos extremos nas últimas décadas só serão mapeados, totalmente, mais para a frente.

As espécies disponíveis para a captura no momento estiveram sob influência das flutuações no nível de água de anos anteriores. Por exemplo, o jaraqui, peixe emblemático da região amazônica, que é capturado hoje, levou, em média, dois anos para atingir um tamanho corporal para ser pescado. Se os anos anteriores foram adequados para a espécie, com disponibilidade de alimento e abrigo, esse jaraqui sobreviveu e se desenvolveu, sendo capturado para fins comerciais.

Há, no entanto, uma percepção geral nas comunidades tradicionais indígenas e não indígenas da Amazônia de que houve uma diminuição na captura de espécies e uma redução do tamanho de peixes de interesse comercial nos últimos anos. Para elas, a pesca é fonte de subsistência importante, gerando renda e alimento.

O contexto se torna ainda mais drástico num país que não tem monitoramento oficial de desembarque pesqueiro na Amazônia desde o ano de 2011. O monitoramento tem o objetivo de conhecer quais são as comunidades pesqueiras que utilizam o acesso próximo ao porto para desembarque da sua produção, gerar informações e dados estatísticos sobre o desembarque pesqueiro e gerar análises dos possíveis impactos dos eventos climáticos extremos na pesca. A falta de dados afeta a capacidade de resposta de comunidades e a tomada de decisões políticas para preservar a pesca na região em tempos de eventos climáticos extremos.

Para enfrentar essa situação, é preciso criar planos de manejo da pesca adequados ao contexto de crise climática, unindo conhecimento tradicional e científico sobre a atividade e as flutuações no nível de água. Só assim se poderá minimizar os graves danos às populações locais que comercializam peixes e vêem, agora, sua subsistência ameaçada.

 

Sobre o autor

Gabriel Costa Borba é doutorando em Fish and Wildlife Conservation na Virginia Tech e mestre em Ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA)

Os artigos de opinião publicados não refletem, necessariamente, a opinião da Agência Bori.

Termos de uso

Todos os artigos de opinião já publicados na área aberta da Bori (e que, portanto, não estão sob embargo) podem ser reproduzidos na íntegra pela imprensa, desde que não sofram alterações de conteúdo e que os nomes e instituições dos autores sejam mencionados.

Ao usar as informações da Bori você concorda com nossos termos de uso.

Publicado na Bori em 12/10/2023, 23:45 – Atualizado em 17/4/2024, 9:46